sexta-feira, junho 18, 2010

à leitura

Todos os dias têm a sua história, um só minuto levaria anos a contar, o mínimo gesto, o descasque miudinho duma palavra, duma sílaba, dum som, para já não falar dos pensamentos, que é coisa de muito estofo, pensar no que se pensa, ou pensou, ou está pensando, e que pensamento é esse que pensa o outro pensamento, não acabaríamos nunca mais.
José Saramago em Levantado do Chão, Ed. Caminho, 14.ª ed., p. 59





Ele, que tanto pensou e nos fez, junto com ele, também pensar, agora se vai. Deixa conosco, no entanto, esse tal "descasque miudinho duma palavra", que cada vez que é lida se renova, faz-se outra diante de nossas vistas nuas, e nos põe frente a ela abobalhados. Por isso esta discreta homenagem, ante a magia da escrita que Saramago tanto conheceu e nos permitiu dela experimentar. Continuará, pois a nos permitir, assim, indefinidamente.

Um comentário:

  1. O Saramago era intelectual às antigas, valorizando sua escrita mais do que instrumento para mero deleite. Por isso, tinha textos ácidos e opiniões marcadas. Para muitos, um defeito. Mas certamente vai deixar uma lacuna nas letras.

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