Chegamos na cidade pelas ruas pacatas do bairro da Novidade com suas casinhas simples, de muros baixos. Vimos crianças a brincar, famílias inteiras nas calçadas durante as tardes dominicais e, à noite, os clássicos namoros ao portão com furtivos beijos atrapalhados. Permanecemos ali por dias, quando nos propusemos a seguir.
Adiante, adentramos o bairro da Amizade, onde experimentamos a sensação de precisarmos um do outro. No parque do bairro, de igual nome, sentamo-nos para observar os transeuntes cheios de cumplicidade e afeto, amigos com tudo o que a amizade oferece. Era-nos um convite. Aceitamos.
A caminho do próximo bairro que visitaríamos - tínhamos em mente chegarmos ao bairro da Aventura -, rumamos pela estrada que estava às margens do Lago da Conquista e o efeito foi instantâneo. Naquele momento, no ímpeto de uma troca de olhares decisiva e decidida, partimos em direção ao bairro do Amor com pressa, sem que precisássemos dizer qualquer coisa.
Era um bairro absolutamente lindo, de muitas cores, embora de patente suavidade. Ali contemplamos a confusão de amadores, própria dos novos amantes, com nosso sorriso, a um só tempo, de compaixão e identificação.
Ruas alegres, cujos nomes eram títulos de canções: Rua Último Romance, Rua Vitrines, Desafinado, Belle de Jour... I Wish You Were Here, Luz e Mistério, Better Together, Eleanor Rigby ou Calle Un Lugar en Tu Almohada, todas organizadas em pequenos distritos, segundo os respectivos intérpretes. Ao entrarmos em cada uma delas, automaticamente se iniciava a canção e, nos cruzamentos e esquinas, tínhamos o silêncio dos apaixonados. Árvores, brisa fresca e cheiro de flores por toda parte, era assim o bairro do Amor.
Por outro lado, havia o grave inconveniente de se tratar de um bairro demasiado confuso, com ruas tortuosas, algumas de uma estreiteza admirável, outras absurdamente largas, praticamente impossibilitando-se a travessia. Cruzavam-se entre si de forma incompreensível, num emaranhado assombroso e desafiante. O perigo nos espreitava e perder-se era quase certo.
No vislumbre doentio que aquele bairro nos causava, recordo-me da derradeira ocasião em que estivemos juntos para nunca mais, no exato ponto onde se cruzavam a Rua Samba do Grande Amor e a Rua Fotos na Estante. Desde então, foi-me impossível saber seu destino, fato este que, de aparentemente trágico, mostrou-se providencial. Segui em frente até que finalmente encontrei um sobrado à Rua Novo Amor que, arrebatada, aluguei. Radiquei-me no local com a sorte de a janela da frente ter uma incrível vista.
Quanto a você, se de passagem, não hesite em entrar para tomarmos um chá ou simplesmente ouvirmos a canção que vem da rua, pois é verdade que está tudo novo como na música.